INQUÉRITO POLICIAL - PROCESSO PENAL - CURSO IEPAT

INQUÉRITO POLICIAL - PROCESSO PENAL - CURSO IEPAT

1) CONCEITO: Inquérito Policial é o procedimento investigatório preliminar, cuja finalidade é a obtenção de subsídios necessários à apuração da autoria e materialidade (nos crimes de vestígio) de uma infração penal, objetivando fornecer ao titular da ação penal elementos que viabilizem o exercício desta (ação penal).

 

2) NATUREZA JURÍDICA: é um procedimento administrativo investigatório, de caráter informativo, preparatório da ação penal.

                       

3) CARACTERÍSTICAS:

 

  1. Inquisitivo: o inquérito policial é conduzido pela autoridade policial (delegado de polícia), que possui a discricionariedade de realizar as investigações da forma que achar mais conveniente. Tem a autoridade policial o poder de direção do inquérito, investigando, pesquisando, inquirindo suspeitos, testemunhas, vítimas, solicitando perícias. Diante desta característica, chegamos à conclusão que o Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa não é aplicado ao inquérito policial. Isto porque não existe acusação, ninguém está sendo acusado de nada. O que há é apenas uma investigação objetivando elucidar os fatos ocorridos. Mesmo o criminoso confesso, mesmo sobre aquele que pairam todas as suspeitas possíveis, não será objeto de acusação, mas sim de investigação. Os Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório são típicos da fase processual, não se aplicando na fase do inquérito policial, que é mero procedimento administrativo. Não que o Contraditório e a Ampla Defesa não se apliquem em seara administrativa, não é isso: tais princípios são aplicados administrativamente somente em relação aos Processos Administrativo, e não aos meros procedimentos administrativos (que é o caso do Inquérito Policial). Evidentemente, o indiciado deve ter seus direitos inerentes à incolumidade física e moral preservados e respeitados.

 

                       Por outro lado, pertinente a observação de César Salgado acerca da inaplicabilidade dos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa em sede de Inquérito Policial:

"Imagine-se a que extremos de inanidade se reduziria a ação do Estado, em face do crime, se fosse permitido colocar-se um advogado à ilharga da Autoridade Policial, durante o inquérito"...

 

Não obstante, o advento da Lei nº 13.245, de 12/01/2016, que alterou a Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da OAB), a regra referente a essa característica (Inquisitivo) e ao próprio sigilo do inquérito policial foi mitigada. Isto porque foi incluído no rol de direitos do advogado (art. 7º) o seguinte:

 XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração:         

  1. a) apresentar razões e quesitos;
  2. b) vetado.

 

A amplitude desse direito certamente ainda será modulada pela jurisprudência. Certo é que, doravante, caso o investigado em inquérito policial tenha constituído advogado, deverá a autoridade policial que estiver conduzindo o procedimento notificar o advogado possibilitando seu comparecimento a todos os atos investigatórios e probatórios, diretos ou indiretos, sob pena de nulidade desses atos e daqueles deles decorrentes.

 

Em relação aos procedimentos investigatórios em curso, que exigem pela sua própria natureza o sigilo extremo (quebras de sigilo, interceptações telefônicas, busca e apreensão etc), aplica-se o prescrito no § 11 do art. 7º da Lei nº 8.906/1994, incluído pela Lei nº 13.245/2016:

§ 11.  No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências. 

 

 Em relação ao disposto no art. 14 do CPP, entendemos que não houve qualquer alteração substancial frente ao disposto na alínea “a” do inc. XXI do art. 7º da Lei nº 8.906/1994, incluído pela Lei nº 13.245/2016. Conforme analisado, possibilitou-se ao advogado oferecer razões (articulados no sentido de justificar ou contestar determinado segmento da investigação) e quesitos. No entanto, continua a autoridade policial a ter a prerrogativa de analisar tais arrazoados e quesitos e, justificadamente, aceitá-los ou não.

 Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade.

              Questiona-se, ainda, se seria possível condenar o réu com supedâneo exclusivo nas provas colhidas no inquérito policial, não havendo renovação das mesmas na fase processual. Ora, é fato que o advento da Lei nº 13.245/2016 estabeleceu uma certa dinâmica de contraditório no inquérito policial, ainda que não se equipare tal situação à fase processual, onde a plenitude do contraditório e ampla defesa deve ser observada com rigor. Porém, o caput do art. 155 do CPP, alternado pela Lei nº 11.690/2008, solucionou polêmica envolvendo o tema, nos seguintes termos:

 Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

 

2. Formal e Escrito: o Inquérito Policial é um procedimento administrativo eminentemente formal. Em razão disto deve ter suas peças obrigatoriamente escritas. Os depoimentos orais devem ser reduzidos a termo, formando, assim, os autos do inquérito de forma cronológica. Atualmente, praticamente desapareceram os inquéritos policiais apenas manuscritos (que dificultavam sobremaneira, principalmente em relação ao entendimento da grafia do escrivão). Os inquéritos são primordialmente digitados em computador, o que facilita bastante o trabalho do escrivão. No entanto, em face à carência de recursos financeiros, a datilografia ainda é plenamente utilizada em nossas delegacias. Deverá, ainda, cada peça do inquérito ser rubricada pela autoridade policial. Esta exigência serve como garantia de acompanhamento das investigações por quem de direito. Assim, não existem inquéritos orais. O art. 9º do CPP define tal característica:

 Art. 9º. Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.

 

3. Unidirecional: o inquérito policial está direcionado para um só rumo, de acordo com o art. 4º do CPP:

Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. (Redação dada ao caput pela Lei nº 9.043, de 09.05.1995)

 

            Assim, sendo a função da autoridade policial meramente investigatória, não pode ela se direcionar para competências atinentes ao Ministério Público ou ao Juiz, não cabendo a emissão de juízo de valor em relação à apuração dos fatos, tais como: indicação de excludentes de ilicitude; que o agente agiu motivado por violenta emoção; por motivo torpe etc.

 

            É exatamente no relatório conclusivo do inquérito policial que a característica da unidirecionalidade é mais abandonada. Nele, deve a autoridade policial limitar-se a elencar as diligências providenciadas e o resultado obtido, concluindo pela existência de indícios ou não que levam a determinada autoria. Ao capitular o fato apurado, caso haja dúvidas, deve optar pela forma mais benéfica ao indiciado; mesmo porque o Ministério Público ou o Querelante (caso de ação privada) não estarão vinculados à tipificação da autoridade policial no relatório. O que realmente importa são os resultados da apuração propriamente dita; razão pela qual a autoridade policial não deve emitir nenhum juízo de valor, em homenagem à unidirecionalidade que caracteriza o inquérito policial.

 

5. Sigiloso: o inquérito policial é um procedimento administrativo sigiloso. Tal sigilo decorre da necessidade da autoridade policial desenvolver as investigações sem a interferência de terceiros. Imaginem se em uma investigação tivesse o delegado de polícia que providenciar a publicidade destes fatos, avisando à imprensa dia, hora, local e modo de operar. Seria o caos. O Estado jamais poderia desenvolver a persecutio criminis de forma adequada, pois os criminosos sempre tomariam ciência prévia dos passos da polícia. Mesmo raciocínio utilizamos na questão do acesso aos autos do inquérito policial. Se qualquer curioso ou jornalista tivesse pleno acesso a tais documentos, o procedimento seria banalizado, prejudicando a devida apuração dos fatos.

 

            No entanto, a Lei Nº 8.906/94 (Estatuto da OAB), lei federal, em seu art. 7º, XIV, fez prever as seguintes prerrogativas em relação ao advogado:

 

Art. 7º. São direitos dos advogados:

.........................................................

XIV – examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital;         (Redação dada pela Lei nº 13.245, de 2016)

           

                        O art. 20 do CPP tratou da questão do sigilo:

 

Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.

Parágrafo único. Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes, salvo no caso de existir condenação anterior.

 

            Interessante observar o disposto no art. 16 do Código de Processo Penal Militar:

 

Art. 16. O inquérito é sigiloso, mas seu encarregado pode permitir que dele tome conhecimento o advogado do indiciado.

 

            Observem que a legislação processual castrense já fazia previsão do sigilo mitigado, em relação ao inquérito policial militar. No entanto, deixava a critério da discricionariedade do encarregado do inquérito a decisão de permitir ao advogado do indiciado ter acesso aos autos.  Porém, o inciso XIV do art. 7º do Estatuto da OAB, também repercutiu no art. 16 do CPPM e o que outrora era faculdade do encarregado do IPM, passou a ser obrigação. 

             

             Ressalte-se que o direito encartado no inc. XIV do art. 7º do Estatuto da OAB recebe como ressalvas o já mencionado § 11 do mesmo dispositivo e também o § 10:

  §10.  Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar procuração para o exercício dos direitos de que trata o inciso XIV.         (Incluído pela Lei nº 13.245, de 2016)

 

             Por fim, em relação ao acesso do advogado ao inquérito policial, a Súmula Vinculante 14 também disciplinou o tema:

 É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

 

 6. Discricionário: o inquérito policial é eminentemente discricionário em relação ao seu desenvolvimento. Dentro dos pontos margeados pela lei, a autoridade policial pode conduzir as investigações da forma que ache ser mais proveitosa. Não está amarrado a procedimentos pré-concebidos do tipo: primeiro deve-se inquirir a testemunha cujo nome comece pela letra “a”; ou deve-se obrigatoriamente pedir prisão preventiva; deve-se obrigatoriamente solicitar mandado de busca e apreensão etc. Dentro dos ditames da lei, a autoridade policial terá liberdade para investigar livremente. No entanto, a discricionariedade não pode ser confundida com arbitrariedade e isto ocorre quando os parâmetros traçados pela lei são ultrapassados na investigação. Neste caso, aquele que se julgar prejudicado poderá contrapor-se a tal arbitrariedade por intermédio de habeas-corpus, mandado de segurança ou mesmo representação perante o juiz competente ou o Ministério Público; podendo, inclusive, a autoridade policial ser responsabilizada por crime de abuso de autoridade (Lei Nº 4898/65). O art. 14 do CPP (já estudado) revela a discricionariedade do inquérito policial.

 

 7. Não Obrigatório: muito embora seja o inquérito policial um instrumento de suma importância para a propositura da ação penal, não é ele imprescindível. É o que se deduz de uma análise ao art. 12 do CPP:

Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra.

 

            Ora, fica evidente que o inquérito policial somente será imprescindível, como elemento instrutório da denúncia ou queixa, quando servir de base para a propositura de uma ou de outra. Assim, quando os fundamentos para a propositura da denúncia ou queixa não estiverem alicerçados no inquérito policial, este não será obrigatório. Mas como se provocar uma ação penal sem a realização do inquérito policial? O art. 27, art. 39 x 5º, o art. 40 e art. 46 x 1º, todos do CPP trazem a resposta:

 

Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

 

Art. 39 § 5º. O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 (quinze) dias.

 

Art. 40. Quando, em autos ou papéis de que conhecerem, os juízes ou tribunais verificarem a existência de crime de ação pública, remeterão ao Ministério Público as cópias e os documentos necessários ao oferecimento da denúncia.

 

Art. 46 § 1º. Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação.

 

            Ao analisar os dispositivos acima, concluímos que não há dúvidas acerca da não obrigatoriedade do inquérito policial para propositura da ação penal, desde que o Ministério Público tenha as peças informativas com elementos necessários a tal propositura. Da mesma forma, em relação aos crimes de ação penal privada, desde que o titular da ação (Ofendido) tenha em mãos peças informativas necessárias ao oferecimento da queixa, deixa de ser imprescindível o inquérito policial.

  

4) FORMAS DE INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL: O inquérito policial, muito embora de característica discricionária, não pode ser instaurado ao livre arbítrio da autoridade policial. Para que seja legitimamente instaurado do inquérito policial, a autoridade policial deverá observar algumas regras específicas e verificar qual a natureza da ação penal relacionada ao delito a ser investigado, tudo de acordo com o art. 5º do CPP. Vejamos:

 

Notitia Criminis: é a “notícia do crime”, forma pela qual a autoridade policial toma conhecimento da ocorrência de um delito. Pode ser ela de cognição imediata (quando a autoridade policial toma conhecimento do fato criminoso através de suas atividades de rotina, quer seja por investigações, quer seja por registro de ocorrência); cognição mediata (quando se tratar de crimes de ação penal pública condicionada ou incondicionada, por intermédio de requerimento do ofendido ou seu representante, requisição do Ministro da Justiça ou do MP; e cognição coercitiva (Prisão em Flagrante).

 

            Vejamos agora as formas propriamente ditas de instauração de Inquérito Policial:

 

  1. De Ofício: Toda vez que a autoridade policial tiver conhecimento de um fato típico penal, excetuado as ações de natureza privada, e obrigatoriamente nas de natureza incondicionada, em que não houve prisão em flagrante delito, deverá instaurar inquérito através de Portaria, temos no código a palavra "de ofício".

Trata-se de uma peça simples, onde a autoridade informa do conhecimento que teve do fato típico e delibera providências no sentido de instauração de inquérito e início das investigações pertinentes.

Não importa de que forma a autoridade tomou conhecimento da ocorrência do delito (notitia criminis) (pode ser através de comunicação pessoal, Boletim de Ocorrência, notícia da imprensa e, até mesmo, notícia anônima). Se a notícia for anônima, a autoridade policial deverá primeiro diligenciar a respeito, comprovando sua pertinência. Não pode ela simplesmente instaurar o inquérito mediante simples comunicado anônimo, sem preceder as investigações preliminares necessárias a angariar o mínimo de aporte necessário à abertura do inquérito policial. Verificando que a infração penal realmente ocorreu e tratando-se ela de crime de ação penal pública incondicionada, o Delegado de Polícia deverá, independentemente de qualquer outra provocação, instaurar o competente Inquérito Policial de ofício, baixando Portaria para formalizar a abertura do mesmo. No entanto, que fique bem claro que a autoridade policial somente poderá iniciar o inquérito policial de ofício, quando o delito a ser investigado for de ação penal pública incondicionada. Nos casos de crimes de ação penal privada, o inquérito policial somente poderá ser instaurado mediante provocação direta e expressa da vítima ou seus representantes. Já nas hipóteses de delitos de ação penal pública condicionada à representação, a autoridade policial também não poderá instaurar o inquérito policial de ofício, devendo aguardar a manifestação do interessado para formalizar o procedimento investigatório. O fato do caput do art. 5º CPP se referir genericamente a “crimes de ação penal pública”, não determina que se possa instaurar inquérito policial de ofício em casos de ação penal pública condicionada. Isto porque devemos levar em consideração o disposto no x 4º do mesmo art. 5º CPP, que estabelece o seguinte:

 

Nos crimes de ação penal pública condicionada à representação, o inquérito não poderá ser iniciado sem esta.

 

Assim, podemos afirmar que o inciso I do art. 5º CPP (de ofício) somente se aplica nos casos de crimes de ação penal pública incondicionada. Se o delito a ser investigado for de ação penal privada ou de ação penal pública condicionada à representação e, mesmo assim, a autoridade policial instaurar inquérito policial de ofício, sem a manifestação dos interessados, o indiciado ou mesmo aquele que esteja sendo investigado, poderá trancar o procedimento investigatório, utilizando-se do Habeas Corpus.

 

Mesmo raciocínio dever ser adotado em relação ao x 3º do art. 5º do CPP, onde está prevista a Delatio Criminis, possibilidade dada a qualquer pessoa do povo que, tomando conhecimento da prática de uma infração penal em que caiba ação penal pública, comunique verbalmente ou por escrito à autoridade policial, que verificará a procedência das informações e determinará a instauração do Inquérito Policial, se for o caso. Assim, também esta hipótese somente pode ser aplicada nos casos de crimes de ação penal pública incondicionada. Vale ressaltar que tal dispositivo encerra mera faculdade em relação às pessoas que não tem o dever legal de indicar tal situação.

 

2. Por Requisição do Ministério Público ou de Autoridade Judiciária: O Ministério Público poderá requisitar à autoridade policial a instauração do Inquérito, em razão de comunicação acerca da ocorrência de algum delito. A autoridade policial não poderá recusar-se a instaurar o inquérito, a não ser que haja justo motivo (se a requisição não fornece o mínimo indispensável para se iniciar as investigações, se o fato narrado for atípico, se a autoridade policial for incompetente etc). Da mesma forma, a autoridade judiciária também poderá requisitar a instauração do IP. (art. 5º II CPP).

 

3. Por Requerimento do Ofendido ou de seu Representante Legal: especificamente no que se refere aos crimes de ação penal pública condicionada à representação e nos crimes de ação penal privada, de acordo com o § 4º e § 5º do art. 5º CPP. Caso a autoridade policial não instaure o IP, não havendo justa causa para a negativa, caberá recurso ao Chefe de Polícia (ou à autoridade equivalente, dependendo da estrutura utilizada pela Unidade de Federação), de acordo com o § 2º do art. 5º CPP.

 

                        Nas hipóteses descritas nas letras b e c anteriores, sempre que possível, o requerimento ou requisição deverá conter as informações previstas no § 1º do art. 5º CPP.

 

4. Através do Auto de Prisão em Flagrante: o APF pode se constituir em peça tão límpida que seja desnecessário a abertura de IP, podendo com seu conteúdo o MP ou o Ofendido oferecer diretamente a denúncia ou queixa respectivamente. No entanto, caso os fatos não estejam bem definidos, funcionará como meio de instauração de IP. Art. 8º c/c art. 304 § 1º CPP.

 

 

4) CARACTERÍSTICAS:

 

                       Consoante já estudado, o inquérito policial é desenvolvido pela autoridade policial de forma discricionária, muito embora essa discricionariedade seja limitada nas hipóteses em que a lei estabelecer algum procedimento específico e obrigatório. O art. 6º do CPP estabelece a sequência de condutas e diligências que devem ser implementas pela autoridade policial tão logo tome conhecimento da prática de infração penal:

 

Art. 6o  Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

        I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; 

        II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;      

       III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

        IV - ouvir o ofendido;

        V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura;

        VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;

        VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;

        VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;

        IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.

 

        Art. 7o  Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.

 

 

5) ENCERRAMENTO:

 

                        O inquérito policial deve ser encerrado dentro do prazo que a lei prevê para tal. Esse prazo varia de acordo com a natureza do crime praticado. Vejamos:

 

1. Prazo Geral do CPP: Indiciado Solto – 30 dias. O art. 10, § 3º, do Código de Processo Penal esclarece, entretanto, que tal prazo poderá ser prorrogado quando o fato for de difícil elucidação. O pedido de dilação de prazo deve ser encaminhado pela autoridade policial ao juiz, que, antes de decidir, deve ouvir o Ministério Público, pois este órgão poderá discordar do pedido de prazo e, de imediato, oferecer denúncia ou requerer i arquivamento do inquérito. Por outro lado, se houver concordância por parte do Ministério Público, o juiz deferirá novo prazo, que será por ele próprio fixado. Indiciado Preso – 10 dias, improrrogáveis.

 

2. Crime de Tráfico de Entorpecentes: Lei nº 11.343/2006:

 Art. 51.  O inquérito policial será concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver preso, e de 90 (noventa) dias, quando solto.

Parágrafo único.  Os prazos a que se refere este artigo podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de polícia judiciária.

 

3. Inquérito Policial Militar: 20 do Código de Processo Penal Militar – Indiciado Solto – 40 dias, prorrogáveis por mais 20 dias. Indiciado Preso – 20 dias, improrrogáveis.

 

4. Crime de Competência da Justiça Federal: 66 da Lei nº 5.010/1966 – Indiciado Solto – 30 dias (a jurisprudência admite prorrogação). Indiciado Preso – 15 dias, prorrogáveis por mais 15 dias.

 

 5. Crime contra a Economia Popular: Lei nº 1.521/1951 – 10 dias – Indiciado Solto ou Preso.

 

 

O inquérito policial deverá ser encerrado com um minucioso relatório do que tiver sido apurado, a teor do § 1º do art. 10 do CPP, remetendo os autos ao juiz competente. Inclusive, no relatório, a autoridade policial poderá indicar testemunhas que não puderam ser ouvidas e o local onde possam ser encontradas. Pode ainda representar ao juiz para baixa dos autos fins complementar a investigação, quando se tratar de caso complexo. Ressalte-se que a autoridade policial deverá primar pela objetividade e evitar fazer juízo de mérito no relatório.

 

Uma vez concluído o inquérito policial, o mesmo é registrado no Juízo competente e, em caso de crime de ação penal pública incondicionada ou pública condicionada (havendo representação), os autos serão encaminhados pelo juiz com vista ao Ministério Público. O Ministério Público poderá adotar as seguintes providências:

 

  1. Verificando que estão presentes os elementos de autoria e materialidade, oferece a Denúncia. Caso o juiz receba a Denúncia, estará iniciada a ação penal. Caso o juiz rejeite a Denúncia, o Ministério Público poderá recorrer (Recurso em Sentido Estrito (art. 581, inc. I, do CPP).
  2. Verificando que as investigações devem ter continuidade, posto que ainda não ministram elementos suficientes para a Denúncia, o Ministério Público poderá requisitar à autoridade policial militar a realização de diligências complementares imprescindíveis ao oferecimento da Denúncia (art. 16 do CPP), fixando prazo para seu cumprimento.
  3. Verificando que a competência para processar e julgar o caso não é do Juízo ao qual está distribuído o inquérito policial, o Ministério Público poderá suscitar a incompetência do juízo, requerendo que os autos sejam remetidos ao juízo considerado competente.
  4. Verificando que as investigações foram esgotadas e não havendo os indícios suficientes ao oferecimento da Denúncia, o Ministério Público poderá requerer ao juiz o arquivamento do inquérito policial.

 

Caso o juiz concorde com o requerimento de arquivamento formulado pelo MP, proferirá decisão arquivando os autos (o que em regra não faz coisa julgada formal). Neste caso, é possível o Desarquivamento, a teor do disposto no art. 18 do CPP, combinado com o Enunciado da Súmula nº 524 do STF. Vejamos:

 

Art. 18.  Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia.

 

Súmula 524/STF: Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.

 

                        Assim, é possível o Desarquivamento do inquérito policial, desde que baseado em novas provas. A polêmica se refere ao conceito de “novas provas”. O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento que é necessário a observância de 3 requisitos para caracterizar a nova prova autorizadora do desarquivamento do inquérito policial:

 

  • Que seja formalmente nova, isto é, sejam apresentados fatos novos, anteriormente desconhecidos.
  • Que seja substancialmente nova, isto é, tenha idoneidade para alterar o juízo anteriormente proferido sobre a desnecessidade da persecução penal.
  • Que seja apta a produzir alteração no panorama probatório dentro do qual foi concebido e acolhido o arquivamento.

 

Caso o juiz não concordar com o pedido de arquivamento deverá adotar o procedimento previsto no art. 28 do CPP:

 

 Art. 28.  Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.

 

Atenção! Cuidado! Em algumas hipóteses, ainda que surjam novas provas, o inquérito policial não poderá ser desarquivado. Entendam que as decisões judiciais podem fazer dois tipos de coisa julgada (quando não mais de admite recurso): formal (quando a questão não pode mais ser discutida dentro da relação jurídica onde a decisão foi proferida, ou seja, dentro de determinado processo) ou material (mais ampla, impedindo a rediscussão da questão em qualquer relação jurídica, dentro do mesmo processo ou em qualquer outro novo processo).

 

Pois bem, discute-se se o arquivamento do inquérito policial é materializado por um despacho ou uma decisão. Evidentemente, há diferenças singulares, posto que, via de regra, o despacho não possui conteúdo decisório e, portanto, não geraria qualquer tipo de coisa julgada. Atualmente, o entendimento (ao nosso entender correto) é no sentido de haver decisão de arquivamento. Porém, uma vez sendo possível o reavivamento das investigações, conforme já visto, mediante o surgimento de novas provas, verificamos que a regra geral é que essa decisão de arquivamento faz somente coisa julgada formal. Isto porque, muito embora a denominação seja “desarquivamento”, o aparecimento de novas provas provocará uma nova relação jurídica e não uma mera continuidade daquela já arquivada. Porém, há exceções. Essas exceções concentram-se em 03 hipóteses, onde, excepcionalmente, a decisão de arquivamento do inquérito policial fará coisa julgada material, impedindo a realização de novas investigações a respeito, ainda que diante de provas inovadoras. Vejamos:

 

a) Decisão de arquivamento reconhecendo a existência de excludente de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular do direito ou estrito cumprimento do dever legal): das três hipóteses, esta é a única em que há discordância na jurisprudência. No STJ a questão é pacífica pelo reconhecimento da coisa julgada material. Já no STF as últimas decisões são no sentido de haver somente coisa julgada formal, podendo as investigações serem reabertas, a teor da Súmula 524/STF e art. 18 do CPP. Então, cuidado! Se cair na prova, atente se a questão está pedindo a posição do STF. Caso não se refira expressamente à posição do STF, a resposta deve ser no sentido do reconhecimento da coisa julgada material.

b) Decisão de arquivamento reconhecendo a existência de extinção da punibilidade (prescrição, indulto etc).

c) Decisão de arquivamento reconhecendo a inexistência do crime.

 

 Vale ressaltar que a autoridade policial está proibida de arquivar autos de inquérito policial, ainda que constate no curso das investigações que o fato não constitui crime ou que efetivamente sequer existiu (vide art. 17 do CPP). Deverá a autoridade policial encerrar o inquérito, fazer constar o resultado das investigações no relatório e remeter os autos ao juiz competente, sendo que este encaminhará ao MP. Cabe tão somente ao MP requerer o arquivamento dos autos, Da mesma forma, compete tão somente ao juiz deferir o requerimento do MP e efetivamente determinar o arquivamento dos autos. Atenção para isso!

 

Por fim, é relevante comentarmos suas situações envolvendo o tema “arquivamento de inquérito policial”:

 a) Arquivamento Implícito. A figura do arquivamento implícito do inquérito policial ocorreria quando na promoção pelo arquivamento ou mesmo quando oferecida a Denúncia, o Ministério Público se omitisse em relação a fatos investigados no inquérito policial. O juiz, ao deferir o arquivamento ou receber a Denúncia, também não provocaria o MP a se manifestar sobre aquele núcleo “esquecido”. Desta forma, parte da doutrina entende que automaticamente aqueles fatos omitidos (quer seja no pedido de arquivamento quer seja na Denúncia) estariam implicitamente arquivados, submetendo-se, portanto, para novas investigações ou mesmo para fins de Denúncia, aos preceitos do art. 18 do CPP e da Súmula nº 524/STF. Digamos que em um inquérito policial esteja se investigando um crime de falsa identidade e um crime de furto. Ao final do inquérito, o Ministério Público denuncia o autor pelo crime de falsa identidade, mas simplesmente se omite em relação ao crime de furto (não requer arquivamento, não denuncia, não faz qualquer requerimento a respeito). O juiz recebe a denúncia pelo crime de falsa identidade, mas também não se apercebe da omissão em relação ao crime de furto (caso notasse, poderia provocar o MP a se manifestar a respeito). Assim, em relação ao crime de furto, teria ocorrido o chamado “arquivamento implícito”. Em que pese parte minoritária da doutrina e mais ainda da jurisprudência admitirem ao arquivamento implícito, a grande maioria dos posicionamentos são contrários a esse reconhecimento, inclusive o STF, sob a alegação de que o arquivamento é um ato motivado, devendo o MP fundamentar seu pedido. Portanto, a mera omissão dos fatos no pedido de arquivamento ou mesmo na denúncia não gerariam o arquivamento desses “esquecidos”, podendo as investigações ter continuidade em relação a eles e, inclusive, servirem de base para Denúncia posterior.

 

b) Arquivamento Indireto. Vimos que, ao analisar o inquérito policial, uma das opções do Ministério Público é suscitar a incompetência de juízo, caso considere que o juízo ao qual foi distribuído o inquérito policial é incompetente para se pronunciar sobre a questão. Se o juiz concordar com a posição do MP, declarará o juízo incompetente e determinará a remessa dos autos ao juízo considerado competente. Até aí não há problemas. No entanto, e se o juiz entender que o MP não está correto e que é competente para apreciar a questão? Neste caso, o juiz rejeitará o pedido de incompetência de juízo. Mas...e depois? Bem, já vimos que o juiz não pode simplesmente dar início à ação penal, precisando de impulso por parte do Ministério Público (nos crimes de ação penal pública). Para parte minoritária da doutrina, ao reconhecer ser competente para apreciar a questão e o MP entender que não, aberta a polêmica, teria sido operacionalizada uma forma atípica de arquivamento, diante do impasse, qual seja o “arquivamento indireto”, submetendo-se novas discussões sobre o tema às limitações estudadas na temática “desarquivamento de IP”. Ora, se o juiz não pode, de ofício, arquivar IP, muito menos poderia ao discordar do MP acerca do pedido de incompetência de juízo, ainda que de forma indireta. Logo, trata-se de figura não aceita pelas maciças jurisprudência e doutrina. A solução correta, nesta hipótese, é a aplicação do preceito do art. 28 do CPP, por analogia. Ou seja, o juiz discordando do pedido de incompetência de juízo formulado pelo MP deverá encaminhar os autos ao Procurador-Geral (Chefe do MP), sendo que se este concordar com o juiz designará um outro promotor para oferecer a denúncia; caso o Procurador-Geral concorde com a promoção do MP, insistirá na incompetência de juízo, sendo aí o juiz obrigado a remeter os autos ao juízo dito competente pelo MP. Atenção!